Em Óbidos, na acolhedora casa de Idaliana (sentada à esquerda), ouvimos Mário contar de sua vivência na imensidão das terras e águas amazônicas. Observador atento daquela Natureza, ele nos relata o transformar da paisagem, a partir de sua experiência de vida como habitante do Baixo Amazonas. Entre os fatos que para ele resultam de ações humanas no tempo, Mário nos chama a atenção para o fenômeno que denomina por “terra caída”: o rio, a cada nova cheia, derruba o barranco das margens, transportando a terra que assim caiu para outros lugares. Assim, ano após ano, as referências geográficas se alteram: novas entradas são abertas pelas águas, antigos igarapés encontram-se hoje assoreados, lagos se ampliam, enquanto outros diminuem. Em seu sítio no Lago João Braz, certa vez, numa ocorrência de “terra caída”, encontraram na margem uma bela estatueta cerâmica antropomorfa, peça exposta na Associação Cultural Obidense (ACOB).
Este artefato singular, acredita Mário, pode ter vindo de muito longe, transportado pelo rio Amazonas, até se fixar em suas terras. Muito tempo depois, o fluxo das águas revelaram a estatueta. Nela vemos um colar com pingente representando um muiraquitã.
Testemunho físico de uma sociedade já desaparecida, a estatueta ali descoberta abriga uma memória que vai além de seu contexto cultural e alcança a transformação contemporânea da paisagem do lugar.
Texto: Silvio Luiz Cordeiro. Imagens: Cristina Demartini, Silvio Luiz Cordeiro, Wagner Souza e Silva.